50 anos da Oficina Brennand – série Amazônica

Certa vez, sobrevoei a floresta Amazônica; um oceano verde sem fim, denso, intenso. Por mais que estendesse a visão daquela janelinha estreita do avião, não conseguia alcançar a sua imensidão. Imaginei como seria difícil ser encontrada no meio da mata, mesmo com a ajuda dos modernos aparelhos de localização.

Com o Google Maps acionado, eu, minha mãe, Thaiza e Kaká partimos com destino a Recife, capital do Estado de Pernambuco, lugar de nascimento e morte do artista plástico Francisco de Paula Coimbra de Almeida Brennand (11.06.1927-19.12.2019). Objetivo da viagem de carro: visitar a exposição em homenagem aos 50 anos da Oficina Brennand.

Elza e Selma

Atravessamos um pequeno trecho de Mata Atlântica, no bairro da Várzea, até chegar às terras do antigo Engenho São João, onde, em 1917, Ricardo de Almeida Brennand (pai do artista) fundou a olaria da família – a Cerâmica São João.

Em 1971, depois de voltar da Europa onde estudou pintura e descobriu a cerâmica de Picasso e Gaudí, Francisco Brennand dirigiu-se ao pai, informando que gostaria de reconstruir a abandonada Cerâmica São João, em sua homenagem.

Brennand fixou ali, não só o seu lugar de ofício, mas a sua vida. Criou uma rotina de trabalho incessante, indo à Oficina religiosamente todos os dias da semana, produzindo desenhos, pinturas, murais, placas cerâmicas, esculturas e escritos até sua morte, em dezembro de 2019.

Dois anos após a sua partida, a Oficina Brennand inaugurou a exposição “Devolver a terra à pedra que era”, para celebrar o cinquentenário de sua existência, recapitulando a sua história através de obras e fotografias do seu mentor ilustre.

Encontramos o galpão da exposição com a ajuda da recepcionista. Em plena quinta-feira, desfrutamos com exclusividade da visita no meio da manhã. Só nós quatro imersas naquele universo, dividido em três núcleos temáticos: Natureza, Cosmologias e Território. Que privilégio!

De imediato, nos chamou a atenção as trezes obras de cores vivas, intensas, densas. Sem nunca ter visitado o pulmão do mundo, Francisco Brennand encontrou um tema fértil para sua pintura. Imaginou os seres encantados da floresta para pintar a série “Amazônica”, nos idos de 1966 a 1971.

Mergulhadas nas telas, assimilamos “uma metamorfose de entes vegetais, animais e humanos, que ganham forma por meio da densidade dos verdes das folhas, de uma cintilância mineral, das carapaças brilhantes dos insetos, do movimento serpenteado dos rios, da cor da terra e do marrom espesso dos troncos das árvores”.

Perdida na miscigenação da Floresta Amazônica e da Zona da Mata Nordestina da cabeça de Francisco Brennand, descobri o porquê de ele afirmar ser a pintura o eixo de sua obra; de ser ceramista por ser pintor.

Preferi permanecer perdida dentro da série Amazônica. Trouxe para casa mais uma descoberta do universo desse genial artista plástico pernambucano. Sem dúvida, o destaque da exposição. Telas de coleções particulares que estarão expostas durante a permanência da mostra nos próximos doze meses. Imperdível!

Francisco Brennand

“… O eixo da minha obra é a pintura, e eu sou ceramista porque sou pintor. Eu acredito que a maior parte da nova geração não sabe nem sequer que eu incursionei pela pintura e que eu sou originariamente, basicamente, um pintor. Na realidade eu criei tudo isso como um vasto cenário, como se eu fosse, mais uma vez, um pintor.”

João Cabral de Melo Neto

O ceramista
Para Brennand

Fechar na mão fechada o ovo
a chama em chamas desatada
em que ele fogo se desateia
e o ovo ou forno tem domadas

Então

prender o barro no ovo
de não sei quantas mil atmosferas
que o faça fundir no útero fundo
que devolve à pedra a terra que era

Francisco Brennand – Demiurgo

Leia também: Visitando a Oficina Brennand, Cerâmica na Paraíba, Tarsila Popular, Frida Kahlo.


OFICINA BRENNAND

ENDEREÇO
Propriedade Santos Cosme e Damião
R. Diogo de Vasconcelos, S/N
Várzea, Recife – PE, 50980-410

VISITAÇÃO
Terça a domingo
10h às 18h (bilheteria até às 17h)

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