Algodão doce

O avião mergulha nos flocos brancos de nuvens espessas. Essa cena sempre me traz à lembrança o algodão doce de carrinho.

Em minha cidade, Mamede era o encarregado de fazer a alegria da meninada. Nos aniversários infantis, lá estava ele. O motorzinho girava um recipiente onde se colocava açúcar cristal. Depois de aquecido, o açúcar era expelido por pequenos orifícios que giravam rapidamente, formando fios de algodão, que logo eram resfriados e adquiriam a forma determinada pelo comandante do processo.

Olhinhos brilhantes e gulosos aguardavam a vez na fila por ele organizada. Com uma colher, Mamede orientava a distribuição do açúcar. Ainda lembro do barulhinho do contato da colher com a cuba de alumínio. Quando chegava ao ponto certo, ele cortava as porções com uma espátula, colocava-as no pedacinho de papel e distribuía a guloseima sem qualquer corante. Saíamos da fila eufóricos para aproveitar a delícia, mas o sonho logo dissipava-se com a umidade da boca, restando as mãos grudentas evitadas pelos adultos.

Ele tinha uma fidalguia nata e um olhar sereno que a todos encantava. Quando casei, reencontrei Mamede na casa dos meus sogros. Com aquela voz mansa, contava sorrindo o susto que teve ao tentar desenterrar uma botija. Foi enxotado por assombração e nunca mais tentou tamanha façanha.

Na minha poltrona, a turbulência resgata-me do estado de transe. Com o gosto do algodão doce na boca, retorno ao presente. O avião nos leva para lugares distantes. As viagens são como sonhos infantis. O avião em velocidade girando em torno do planeta em direção a um mundo encantado, tipo o recipiente que expele a guloseima infantil.

Aterrissamos em terras estrangeiras, dias diferentes, distantes da realidade, da rotina do dia a dia, espaço de tempo aproveitado em costumes distintos, comidas desconhecidas, novos sabores, olhares curiosos, paisagens deslumbrantes, histórias de conquistas e derrotas, arte retratando épocas.

Depois de alguns dias, a saudade de casa bate à porta. Hora de retomar à realidade. No final, restam as lembranças e os aprendizados. No percurso de volta, torres de nuvens espessas feito algodão doce.


Somos quem podemos ser – Engenheiros do Hawaii

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3 comments

  1. Que maravilha, Elzinha!! 👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻

  2. E se eu lhe disser que até hoje, nas festas infantis da família, ainda me encontro na fila dessa delícia!!!!

    Parabéns Elzinha, fico aqui no aguardo pela próxima!!!

    1. Muito obrigada Jacqueline! Aproveite suas festas com algodão doce.

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