Antropofagia – Tarsila do Amaral, 1929
Em 1982, o Brasil realizava suas primeiras eleições diretas pós 1964, para os cargos de governador, senador, prefeito, deputado federal e estadual. Dentre os eleitos para governador e senador, nenhuma mulher. Apenas o Acre contava com a Vice-Governadora Iolanda Fleming e a suplente de Senador Laélia de Alcântara.
Mesmo assim, Rita Lee lançou a música Cor de Rosa Choque, que foi tema do programa TV Mulher e fala do sexo frágil que não foge à luta, bicho esquisito que todo mês sangra. Precisou se explicar na censura, como ela mesma conta em seu livro – Rita Lee Uma Autobiografia: “Sabe quando a senhora antes de menstruar sente uma esquisitice hormonal e meio que dá uma pirada? Então, é isso que eu quis dizer. Na época ainda não existia a sigla TPM para explicar melhor”.
Pois é, a mulher é mesmo bicho esquisito. Se quer um bom conselho, não a provoque pouco antes da menstruação, seu corpo está repleto de líquido retido, pronto para explodir ao mínimo sinal de contrariedade. O humor feminino oscila à mercê dos hormônios, essas substâncias que têm a enorme capacidade de alterar nosso corpo. Uma hora retém líquido, outra esvazia por deixar de ser fecundada.
Quando engravida, a mulher estica, estica, estica, gerando um ser vivo que lhe suga maravilhosamente as entranhas por nove meses. Na hora certa, sua criança é expulsa com uma grande quantidade de líquido. O corpo começa a regredir, deixando apenas o solene e ímpar ato de amamentar, que só ela desfruta.
Esgotadas as possibilidades de gerar uma nova vida, os hormônios vão rareando e o corpo responde novamente como uma balança…. Seu metabolismo torna-se lento e qualquer liberdade no ato de degustar uma boa comida torna-se excesso difícil de digerir. A mulher entra na maturidade (para não dizer outros nomes que a mídia evoca), mas que retrata apenas os efeitos do tempo.
O lado bom é que a mulher continua a ser bicho esquisito, com enorme capacidade de adaptação e disposição para luta. Antropófaga, engole diversos “sapos”, para regurgitá-los em conquistas e seguir seu destino de gerar mudança, feito o movimento da arte brasileira do final dos anos 20 do século XX.
Começando os anos 20 do século XXI, as mulheres incrementaram sobremaneira a participação na política. Atualmente, são 12 senadoras em exercício, 77 deputadas federais, 01 governadora e diversas deputadas estaduais e vereadoras. No cenário mundial, chefes de estado femininas estão presentes nos quatro continentes.
Com o sexto sentido maior que a razão, sigamos o caminho em procriar e ensinar aos filhos e filhas o respeito à bela e à fera, princesa ou gata borralheira.
Vinicius de Morais
RECEITA DE MULHER
Ah, que a mulher dê sempre a impressão de que se se fechar os olhos
Ao abri-los ela não mais estará presente
Com seu sorriso e suas tramas. Que ela surja, não venha; parta, não vá
E que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos fazer beber
O fel da dúvida. Oh, sobretudo
Que ela não perca nunca, não importa em que mundo
Não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade
De pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma
Transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale sempre
O impossível perfume; e destile sempre
O embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto
Da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina
Do efêmero; e em sua incalculável imperfeição
Constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação inumerável.
Renato Russo
1º DE JULHO
Sou fera, sou bicho, sou anjo e sou mulher
Sou minha mãe e minha filha, minha irmã, minha menina
Mas sou minha, só minha e não de quem quiser
Adélia Prado
COM LICENÇA POÉTICA
Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
– dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.
Martha Medeiros
QUANDO CHEGAR
Quando chegar aos 30
serei uma mulher de verdade
nem Amélia nem ninguém
um belo futuro pela frente
e um pouco mais de calma talvez
e quando chegar aos 50
serei livre, linda e forte
terei gente boa ao lado
saberei um pouco mais do amor
e da vida quem sabe
e quando chegar aos 90
já sem força, sem futuro, sem idade
vou fazer uma festa de prazer
convidar todos que amei
registrar tudo que sei
e morrer de saudade.
Acesse também: Música em poesia, Ser criativa e Desbrochar da primavera.
4 comments
Muito bom este site, estão de parabéns.
Desejo sucesso!!!
https://comprenanet.com
Muito obrigada, navegue sempre no blog.
Apenas repetindo Rita Lee, …”toda mulher quer ser amada, toda mulher quer ser feliz”…
Desejo básico para todo ser humano.
Rita Lee com sua loucura cheia de lucidez!