Desafiadora Waynapicchu

O hotel Belmond Sanctuary Lodge fica encravado na montanha, avistando a cidadela, como se fosse sua continuação. A tranquilidade reina no lugar, sentimos como se fizéssemos parte de uma civilização pré-colombiana. O último ônibus desce de Machu Picchu para Aguas Calientes às 17h30; depois desse horário, só se a pessoa enfrentar a descida íngreme a pé. Então ficamos isolados, dormindo na paz daquele santuário.

Acordei bem cedo para pegar a luz mais propícia à fotografia. Estava de prontidão para entrar na primeira leva às 06h da matina. A decepção foi grande, porque a neblina e as nuvens cobriam a cidadela e as fotos ficaram para depois. Dirigimo-nos à entrada de Waynapicchu (Huayna Picchu) – aquela montanha que aparece em todas as fotos de Machu Picchu, lembrando o Corcovado. Comprei com antecedência os ingressos pela internet, que são limitados a 400 por dia, divididos em duas turmas, sendo uma às 7h e outra às 10h.

Não sei onde estava com a cabeça quando decidi escalar aquela montanha sagrada e ainda levar os integrantes do grupo para o desafio. Meu marido achou um absurdo, disse que estava pondo todos em risco e assumindo a responsabilidade se algo acontecesse. Mesmo assistindo a alguns vídeos da subida, achei que não seria tão difícil. Errei feio.

Logo na entrada, uma placa enorme avisa que crianças até 12 anos estão proibidas de subir, assim como cardíacos e pessoas com problemas de saúde. Mesmo aos cinquenta anos, achava-me a própria adolescente, com mochila nas costas, abastecida de água e algumas barrinhas de cerais para aplacar a fome. A expectativa e a ansiedade como únicos estimulantes.

A subida iniciou sob neblina. Um pé lá, outro cá, degraus e degraus molhados e escorregadios faziam os olhos fixarem-se no chão. Em alguns pontos, cordas para apoio ou um faz de conta de proteção. Aos poucos o coração vai batendo forte, com palpitações que chegam aos ouvidos. A concentração é grande no caminho estreito e perigoso. De quando em quando, alguns terraços oferecem paradas estratégicas para o descanso e a fotografia.

A neblina vai sendo tangida pelo vento, para revelar vistas estonteantes. Descobrimos a estrada em ziguezague de Aguas Calientes até Machu Picchu, as águas barrentas do rio Urubamba serpenteando as montanhas e, por fim, a cidadela de um ângulo que somente quem tem a coragem e a disposição para a escalada tem esse privilégio.

Focadas somente em chegar ao cume de 2.693m, passamos por uma fenda e chegamos ao topo. Uma sensação de conquista, de estar literalmente nas nuvens. Em nenhuma hora pensei em desistir e Tia Dulcinha ao meu lado, firme e forte, mas exausta. Os jovens eram mais resistentes e fizeram o percurso com mais tranquilidade.

Ao iniciar a descida e olhar para baixo, constata-se o quão desafiadora, íngreme e perigosa é a trilha. Os joelhos são bem exigidos. Os meus, já desgastados de outros carnavais, sofreram bastante. Tive que voltar com a perna esticada no corredor do trem para Cusco.

Após quase 4h horas de percurso, quando o normal seriam 2h30, voltamos ao hotel para almoçar, encerrar a conta e fazer o passeio ao sítio arqueológico de Machu Picchu, devidamente acompanhados por um bom guia, imprescindível para receber todas as informações sobre o complexo sistema arquitetônico e de engenharia daquela intrigante cidade inca, considerada uma das sete maravilhas do mundo.

Confesso que meu corpo estava exaurido e que a visita à cidadela ficou um pouco prejudicada. Naquele momento, não sei se optaria por escalar Waynapicchu. Mas hoje, depois de refletir um pouco e ter escapado ilesa, não estou arrependida. Fui e vivi alguns momentos como uma sacerdotisa inca (será que existiam sacerdotisas mulheres?). Subindo e descendo aquela “Montanha Jovem”, provei que ainda tinha preparo para tanto, apesar da idade. Tia Dulcinha que o diga, mesmo sendo educadíssima, não deixou de usar uns palavrões para desabafar seu cansaço!

Fica a dica para quem pensa em visitar a impressionante Machu Picchu. Reflita bastante antes de optar por subir Waynapicchu. Se estiver em boa forma física, não tiver medo de altura e não sofrer de vertigem ou tontura, use um bom calçado antiderrapante e siga em frente. Caso contrário, melhor ficar somente com a cidadela.


Fernando Pessoa

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.

A origem de Machu Picchu – National Geographic

Acesse também: Peru fascinante

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2 comments

  1. Melhor se arrepender do quê fez, do quê deixou de fazer…guardar na memória viagens incríveis não tem valor.
    Continue nos dando boas dicas!!!

    1. Essa vai ficar bem guardada na memória, acho que nem quando estiver caduca, irei esquecer, kkkkk. Valeu demais a pena.

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