Memórias na ponta do pé

Foto capturada no site http://rnsustentavel.rn.gov.br/

O antigo Palácio do Governo, também conhecido como Casarão da Rua Chile, construído antes de 1869, hospedou no final do século XIX o Conde D’Eu, casado com a Princesa Isabel. Foi ainda neste palácio que Pedro Velho anunciou, da sacada, que havia sido proclamada a República no Brasil. Deixou de ser a sede do governo local em 1902, com a transferência para o Palácio Potengi, na Cidade Alta.

Durante a Segunda Guerra Mundial, o edifício histórico abrigou o Wonder Bar, depois ficou um tempo abandonado e, em 1989, voltou a ser propriedade do Governo do Estado. Hoje, é a sede da Escola de Dança do Teatro Alberto Maranhão – EDTAM. Passou por um processo de restauração (finalizado recentemente), mas ainda continua com os tapumes vedando a entrada.

Para celebrar a restauração desse importante edifício do nosso patrimônio histórico-cultural, convidei Renata Fernandes Paiva, ex-aluna do EDTAM, para escrever sobre a dança. Ela produziu o texto a seguir, demonstrando toda sua paixão pelo corpo em movimento.


MEMÓRIAS NA PONTA DO PÉ

A casa é um sobrado. Pequena como deve ser. Porque nos traz um sentimento de acolhimento, que nos remete imediatamente a colo de avó e àquele cheirinho de criança indo pra escola. Fica situada na Ribeira, coração da cidade do Natal, na Rua Chile. Claro, onde mais poderia ser?

Ao contrário do que muitos pensam, a dança clássica nunca foi uma dança de elite. Em meados do século XIX, na chamada Belle Époque parisiense, podia se ver nas ruas as pessoas se expressando em diversas formas de dança, inclusive a clássica. Portanto, era um movimento urbano.

A dança de um modo geral, assim como o canto e a pintura, eram feitos na rua, de uma maneira que todos pudessem compartilhar. Aliás, esta palavra está muito difícil de ser empregada e principalmente executada atualmente. Resgatar essa essência da dança é sobretudo um ato de resistência e coragem.

Sempre digo com certeza e convicção, que a arte nos salva de nós mesmos, assim como a música popular brasileira, tão maltratada, aviltada e violada. O que nos salva e nos salvarão sempre são: a palavra bem escutada, a canção não somente cantada e a alma acalentada. Ferreira Gullar disse: “A arte existe, porque a vida não basta! ”.

Preservar a nossa raiz histórica deveria ser um dever de todos. Todos nós possuímos alguma veia artística, seja ela qual for, e deveria ser quase uma obrigação não só exercê-la como divulgá-la e compartilhá-la.

A arte é sobretudo um ato de coragem e de extrema importância para a formação da cultura de um povo. Com a dança, seja qual for a maneira executada, não é diferente. Pois, na verdade, ela é refletida através da história de um lugar.

A cultura e os nossos corações apaixonados e ávidos pela dança agradecem pela existência, mas sobretudo pela sobrevivência com a bela restauração feita na Escola de Dança do Teatro Alberto Maranhão – EDTAM, onde fui aluna e me orgulho muito.

Essa resistência da arte e da cultura de um povo só se consegue através de duas coisas: luta e paixão pelo que se gosta de fazer. Com isso se sente um prazer incomensurável em partilhar. Jean Jaques Rousseau, o filósofo da liberdade, disse: “tout ce qui n’est pas donné est perdu”.

Portanto convido a todos vocês, que estavam se sentindo meio órfãos como eu das nossas raízes tão ricas e de tão diferentes matizes, a mergulharem e, sobretudo, a renderem-se ao que tanto nos falta…

Parabenizar, abraçar e agradecer a todos que trabalham de maneira incansável, com afinco e persistência, pela sobrevivência da EDTAM. Que lutam sim, com valentia e muito esmero para dar continuidade e longevidade àquele lugar. Viva a EDTAM ! Bravo!! Todos os aplausos merecidos para você.

É assim que meus ouvidos te veem.

Com amor,

Renata Fernandes Paiva


Isadora Ducan

O corpo do bailarino é a manifestação luminosa da alma.

Carmen Suite – Svetlana Zakharova

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4 comments

  1. Belo e oportuno esse texto da bailarina Renata Fernandes Paiva, ex-aluna do EDTAM, para a reflexao sobre a importância da dança como expressão cultural e educação do povo. Além de ser um compromisso social imprescindível do Estado. Parabéns!

    1. Zilton, cada dia mais necessário divulgar, incentivar e compartilhar as expressões culturais do nosso povo, em prol da educação! Muito obrigada. Compartilhe o post à vontade e navegue no blog, tem muito material para conhecer. Abraço

    1. O corpo em movimento nas palavras de Renata! Obrigada José Bezerra Marinho.

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