No controle remoto

Às vezes me indago sobre o porquê de tanta necessidade de o homem segurar o controle remoto da TV. Talvez seja um efeito psicológico retardado, representando o cetro do tempo em que o sexo masculino detinha a hegemonia do lar e a mulher ficava restrita aos limites da cozinha, sem direito sequer a participar das conversas na sala.

O mundo evoluiu e nós, mulheres, encontramos diversas maneiras de nos expressar, sobretudo verbalmente. O silêncio foi quebrado e agora podemos falar à vontade. Para eles, a nossa voz soa como um mimimi – pura insegurança masculina para se adaptar aos novos tempos.

Incapaz de conter a nossa liberdade, principalmente a verbal, os homens limitam-se a um mero controle remoto, como detentor de um poder absoluto sobre o aparelho eletrodoméstico. Podem silenciá-lo à vontade, trocar de canal, mudar de assunto, altear o som, reduzir o barulho. Domínio impossível sobre o universo feminino.

No isolamento social, então, o controle exacerba-se. Se o casal divide a mesma TV movida por controle remoto, a mulher fica em desvantagem, mas como ela detém um cérebro multitarefas, encontra logo novas opções no universo infindável do computador, tablet ou celular. Eles permanecem restritos aos programas de esporte (pura necessidade de competição testosterônica – será que essa palavra existe?).

Conheço um casal que, não bastasse o marido deitar na rede e agarrar literalmente o controle remoto, o cachorrinho de estimação dorme junto e, a qualquer movimento suspeito para usurpá-lo, rosna como fiel guardião do objeto e de seu dono. Cumplicidade do macho alpha entre espécies domésticas diversas.

Mas nós, mulheres, não fugimos à luta. Invertemos os papeis. Agora seguimos de língua solta, exprimindo nossa vontade. Ainda pouco acostumados à falação e até um pouco amedrontados e perdidos, eles desenvolvem uma capacidade de abstração. Fazem de conta que estão ouvindo, mas o pensamento voa longe.

Alheias à abstração masculina, seguimos nosso caminho. Insistimos em trocar ideias, falar e ouvir, participar da escolha do canal e de tantas outras coisas, de igual para igual, segurar um pouco o controle remoto. Somos experts em adaptação e logo encontraremos a solução para dividirmos a TV, remotamente, apenas com a força do pensamento. Aguardem.


Ksenona – Satisfaction (The Rolling Stones cover)

Acesse também: Música na quarentena, Velha roupa descolorida, Música e adolescência, Bicho esquisito.

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8 comments

  1. Rsrsrs…. Estou percebendo que esse “apego” ao controle remoto é geral. Eles precisam controlar algo, e como já não controlam suas companheiras, agarram-se ao controle com total posse.
    O pior, quando mudam o canal sem prévia consulta!
    Essa crônica foi providencial, Elzinha! 👏🏼

    1. Tudo igual nessa cabeça masculina, ainda bem que só restou-lhe o controle da TV, kkkkk

  2. Morrendo de rir aqui, este texto se encaixa perfeitamente aqui em casa. Que luta 😏

    1. Pois é, luta grande essa das mulheres na busca de usurpar o controle, 😂😂😂.

  3. Morrendo de rir aqui, Elzinha! E enquanto ria, meu marido dizia: peraí, jan. Tá atrapalhando o programa.
    Incrível como você traduziu, com perfeição, o que é a síndrome de o macho alfa precisar estar a todo instante “no controle remoto”.
    Ainda estou aqui me acabando de rir, sozinha “com meus botões”, com esse seu texto maravilhoso!

    1. Oi Janaína, esse comportamento masculino na defesa do controle do controle remoto se repete entre vários casais, tinha que dar uma crônica, rsrsrs.

  4. NO CONTROLE REMOTO. A pura verdade. Agora imagine na quarentena. É pra ficar tudo maluco.

    1. Na quarentena, os nervos estão à flor da pele, então é preciso ter cuidado, rsrsrs.

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