O mar está para peixe

O mar está para peixe e para banhista também. Maré morta bem viva! Água de um verde esmeralda, transparente.

Com o chão de areia gostoso de pisar, estou mesmo em praia potiguar, Nordeste brasileiro, meu país, nosso Brasil, Porto Mirim.

Bem atracada, observo a maré baixando, ainda preamar de Lua crescente. Vamos ao mar? Um a um, fomos entrando na água.

Cada um que chegava se impressionava com o translúcido da água: “dá para ver os pés tocando a areia”!

Só marolas, bom para boiar; de vez em quando, agulhas nadando na correnteza ou contra ela.

Deixo-me levar flutuando… fecho os olhos e sinto o barulho da água do mar. Você já experimentou boiar de olhos fechados? Fiz isso na cachoeiras do Jalapão, no mar é diferente, mas tudo é imersão no próprio eu, em meus pensamentos ou na ausência deles.

Só o movimentar das águas me transportando para longe. O vento mudou a direção: é vento maral, do oceano para terra, trazendo águas límpidas para o mar e o sertão.

As águas começaram a correr nos riachos, engrossando o caldo, virando redemoinho, levando tudo no rio, lavando a terra, irrigando a alma. Sorrio, sou rio.

E eu ali flutuando. Ao redor da família no banho de mar, já pensando nos escritos, porque escrevo aquilo que me traz emoção recolhida, contida, incutida, … que explode em palavras.

A maré baixando, os dedos enrugados, o corpo lavado, a alma salgada. Hora de sair. O verde esmeralda deixando saudades do melhor banho de mar do veraneio.

É verde que chega ao sertão! Parece que teremos bom inverno; o mar realmente está para peixe.


Zila Mamede

Canção do vento e do teu amor

O vento que vem de longe,
o vento que vem do mar,
o vento que chega à toa,
vem à toa me chamar.

Velho vento intrometido,
aos pulos, solto, vadio,
invade a minha janela,
enche o meu quarto vazio.

Vento, vento foi-se embora
levando um pouco de mim.

Teu amor é como o vento:
chega e foge sempre assim.

Enquanto escrevo, me deparo com o bordado de Angela Almeida no Instagram; poema de José Bezerra Gomes:

Mealheiro

Meu avô
a camisa por cima da ceroula
no mourão
da porteira do curral
de pau a pique
cheirando a estrume
Contando
os bezerros
novos
das vacas paridas
Minha avó
no santuário da capela
o rosário de contas
de capim santo
nas mãos devotas
Nos terços
nas novenas
de maio
o mês das flores
As espigas
de milho
verde
bonecando
nos roçados
Os algodoeiros
casulando
As ovelhas
malhando
na sombra
das quixabeiras
O rio
A cheia
A água
barrenta
da correnteza
transbordando
pelas vazantes do rio cheio
Os sapos
os cururus
cantando
dentro das noites
empoçadas
As tanajuras
Esvoaçando
na luz
das lamparinas
As flores
do mato crescendo
pelos caminhos orvalhados
rescendendo
Os meninos
gordos
de terra
sob a chuva
sob o inverno
se banhando
As veredas
trilhadas pelos preás
Os ninhos
dos concrizes
balançando
na copa das braúnas
As asas
dos urubus
pairando
paradas
no céu
encandeando
A barra das madrugadas
O aboio dos tangerinos
As alpregatas
de meu avô
arrastando
nas lajes do alpendre
do mundo
de minha infância.

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