Praia de Porto Mirim
Chegamos, de novo, ao fim do ano. Corrida para compras, sacolas, pacotes, presentes. Confraternizações, família, amigos, trabalho. Natal, amor ao próximo, solidariedade, paz. Necessidade de pôr em prática todo esse espírito de luz. Um brinde ao novo ano que começa!
Verão em terras tropicais, casas de veraneio renovadas. Estradas congestionadas, todos seguindo o rastro dos antepassados, que trocavam o sertão — na sua época mais quente — pelo litoral. Tradição preservada, costume sedimentado. Caminho para as praias na busca dos alpendres redários, prontos ao acolhimento.

Cheiro de maresia impregnado no ar, brisa embalando suavemente as varandas das redes, farfalhar inebriante dos coqueirais. Como dizia Quintana, vento pastoreando as nuvens escassas, ocupando-se em salpicar os pensamentos. Preguiça aquecida pelos raios solares, corpos ociosos, descanso merecido.
Luminosidade em abundância, olhar encandeado de tanta cor. O azul-celeste mesclando-se ao marinho na linha do horizonte. Próximo à terra, arrecifes barram o oceano, faixas de pedras escuras no verde-esmeralda, graças ao pouco vento que serenou suas águas e descansou suas areias. Brancas dunas, pôr do sol alaranjado; no lado oposto, um céu em dégradé.
O sol na mais pura exuberância, queimando a pele ardente, sensualidade acentuada, pensamentos lascivos. Mistura de cores, ritmos e sons. De dezembro a março, o verão é um estado de espírito festivo. Casas abertas aos visitantes, sorrisos esbanjados na face, muros desnudos, mesas fartas, músicas tocando, alegria compartilhada, conversas e mais conversas jogadas fora, sem hora marcada, seguindo o movimento das marés.
Mar que embala meus sonhos com seu barulho incansável, incessante, repetitivo. Amanheceu, não ouço o passarinhar do sertão, ouço o estrondo das ondas no muro. Mar — lembro-me da escassez no sertão —, seria tanta água um desperdício? Penso que não. É água inundando o olhar, banhando a terra, energizando o ser vivo.

Ao entardecer, corpos embriagados mergulham no lusco-fusco relaxante. Quando o mar recua, sobra um chão de areia molhada para caminhada. Pés descalços, contato direto com a natureza, senhora Mãe das horas. É ela quem determina o passeio de barco, o banho de mar, preamar, lua cheia, maré seca, lua minguante, maré morta, lua nova, maré forte, lua crescente.
Janeiro é maré de lua grande. Quando ela surge sorrateira na linha do horizonte, desligam-se os interruptores. A lua é a única luz a ser apreciada. Momento propício a um violão, luar na beira da praia. O mar servindo-lhe de espelho, refletindo seu brilho durante a noite, enquanto seres humanos são encantados por sua beleza.

Abaixo da linha do Equador, o verão inicia quando o ano se finda. Seu ápice é o mês de janeiro. No Brasil, encerra-se com o Carnaval. Hora de voltar realmente ao trabalho. Corpos e mentes revigorados para o início de novo ciclo.
* Crônica publicada na revista RIOCENTER | 2019 | Ano 07 | Edição 15
Emily Dickinson
Algo existe
Algo existe num dia de verão,
No lento apagar de suas chamas,
Que me impele a ser solene.
Algo, num meio-dia de verão,
Uma fundura – um azul – uma fragrância,
Que o êxtase transcende.
Há, também, numa noite de verão,
Algo tão brilhante e arrebatador
Que só para ver aplaudo –
E escondo minha face inquisidora
Receando que um encanto assim tão trêmulo
E sutil, de mim se escape.
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