Noite estrelada

Do alto do apartamento, debruçada sobre a janela, observo a tarde que ligeira virou noite. Os sons da cidade modificam-se, tornam-se mais serenos, menos estridentes. Os carros passantes rareiam e o sopro da brisa suave é bem mais perceptível.

Em contrapartida, luzes variadas invadem o olhar, ofuscando o brilho das estrelas pela proximidade e variação de matizes. São postes de iluminação pública, faróis de carros, luzes de freio, sinalizadores no alto dos edifícios, luzes brancas, mornas, azuladas, amareladas. Interruptores acesos, corpos em movimento, luzes apagadas, lares adormecidos.

Vem à mente a Noite Estrelada de Van Gogh. Enclausurado voluntariamente no hospício em Saint-Rémy-de-Provence, após a auto mutilação, o célebre pintor holandês retratou a visão da janela do quarto em que dormia, um pouco antes da noite que começava a virar dia, registrada inicialmente em esboços sobre papel.

Transportada para tela, o mundo foi presenteado com um céu noturno, intenso, vibrante, vigoroso, camadas e camadas de pinceladas em turbilhões azulados, movimentando-se em espirais, abraçando uma lua majestosamente brilhante, adornada de estrelas circulares com a Vênus em destaque.

Noite Estrelada de Van Gogh – Trabalho exposto no MoMA – The Museum of Modern Art – Nova Iorque / EUA

No quadro, o céu esplendoroso vela o sono tranquilo dos moradores de uma pequena vila em torno da torre da igreja, protegida por montanhas onduladas, coletânea de paisagens provençais registradas na memória do pintor. O cipreste em primeiro plano ligando a terra ao eterno.

Na capital potiguar, a vista do morro serpenteia em direção ao infinito. Mãe Luiza, parteira lendária que ajudou a parir tantos e quantos que aqui habitaram. Segundo Câmara Cascudo, “Mãe Luiza foi uma velha negra ali residente, talvez ex-escrava, anos e anos numa choupana de palha de coqueiros, na encosta silenciosa do morro. Dona do terreno por usucapião maquinal, nenhum documento garantir-lhe-ia a posse, mansa e pacífica, dos pobres metros quadrados residenciais, com galinhas, um pé de manjericão e o cachorro magro, imortal. Mas é a madrinha eterna do topônimo. Inútil dar o nome sonoro de um homem deslumbrante. Ninguém recordará a mudança, sentindo a substancia bajulativa, Será perpetuamente, Mãe Luiza! O povo defende o patrimônio humilde de suas preferências.”

Guiada pelo farol, continuo a divagar… Ao contrário do quadro famoso, observo um céu esmaecido pelas luzes da cidade, não mais uma pequena tranquila vila.

Quantos moradores enclausurados em edifícios de alturas variadas, sem torre de igreja a sobressair na tela. Forçados a morar aglomerados em nome da segurança, enquanto perturbados sociais de toda espécie ceifam vidas humanas, mutilam corpos alheios, sem nada produzir, a não ser um medo crescente e incontrolável na sociedade.


Visite também:

Van Gogh Museum – Amsterdam / Holanda

Fondation Vincent Van Gogh – Arles / França


Don McLean | Vincent (Starry Starry Night) | Legendado Tradução (Van Gogh)

Don McLean escreveu “Vincent” em seu apartamento cheio de antiguidades. A inspiração veio numa manhã, enquanto ele estava sentado na varanda olhando um livro sobre Vincent Van Gogh. Apreciando uma impressão da pintura “Noite estrelada”, ele percebeu que uma música poderia ser escrita sobre o artista por meio da pintura.

Don McLean

Quanto mais eu pensava nisso, mais interessante e desafiadora a ideia se tornava. Larguei o livro e peguei meu violão, que nunca estava longe, e comecei a mexer, tentando entender a ideia, enquanto a impressão de “Noite Estrelada” me encarava. Olhando para a foto, percebi que a essência da vida do artista é sua arte. E então, eu deixei a pintura escrever a música para mim. Todo mundo está familiarizado com essa pintura.

Éblouissant ! Les Carrières de Lumières accueillent Van Gogh – Baux de Provence

Assista:

No Portal da Eternidade – Trailer oficial

Com Amor, Van Gogh – Filme completo

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2 comments

  1. Oh! Elzinha. Você que sabe da anedota que mostra a sabedoria, eu Repito:
    OU COISA BOA QUEM SABE LER!…
    BEIJOS, Neide.

    1. Oi D. Neide, muito obrigada, sigo nos meus escritos para compartilhar com os leitores.

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